segunda-feira, fevereiro 25, 2008

Siam

Esta história é para todos aqueles que já usaram o sapato direito diferente do esquerdo, meias de cores diferentes ou camisolas que não combinassem com as calças e se sentiram extremamente observados pelos seres colorida e simetricamente correctos que nos rodeiam.

Esta é a história de uma borboleta chamada Siam-Lim que, apesar de ter um nome começado pela letra S, tinha um grave problema. A borboleta tinha asas de cores diferentes, uma era vermelha e branca e a outra era amarela. Cansada da vida miserável que tinha, Siam decidiu um dia partir pelo mundo à procura de uma explicação para o seu azar e para a sua infelicidade.

Algum tempo depois de ter começado a sua jornada encontrou um macaquinho que chorava, enroscado numa árvore, com as mãozinhas a tapar a cara. A borboleta perguntou-lhe:

-Porque choras tu macaco? Tu nem asas tens.

-Asas? Não tenho asas nem tenho filhos e por isso é que eu choro. Não faz uma semana tive três macaquinhos que, embora tal o fossem, eram muito bonitos para mim e deles muito eu gostava. Dois dias depois de ter os meus três filhos veio uma grande tempestade que me afogou dois deles, pois apenas um pude escolher para salvar. Como escolhi? Tarefa ingrata que não desejo nem ao babuíno, que é o meu maior inimigo. Tive que escolher, pois apenas um podia salvar, e foi o que fiz, não por gostar mais desse em particular mas porque me pareceu o mais aterrorizado com a morte em forma de agua, ou por ter uma maior percepção do perigo ou por ser dos três o menos corajoso. A tempestade passou e levou dois dos meus macaquinhos deixando-me apenas um. A chuva acabou e a vida continuou. Continuou mas por pouco tempo porque ontem, enquanto dormia, levaram-me o meu ultimo filho deixando-me neste estado de desconsolo que agora vez. É por tudo isto que eu choro.

A borboleta ficou muito admirada, o macaco já tinha parado de chorar soluçando apenas de vez em quando. A borboleta disse:

-Não sou muito velha e por isso não passei muito na vida mas nunca vi razão tão tola para se chorar. Perdeste os teus filhos mas sempre podes ter outros. Quando acaba a tempestade vem a bonança e haja macacas nas árvores que filhos não faltam. A minha situação é muito mais aguda e digna de pranto. Olha bem para mim e repara. Já reparaste?

O macaco não percebia nem reparava nada e deu-o a entender por gestos, então a borboleta continuou.
-As minhas asas! Tenho uma asa de cada cor e não é coisa que passe ou que o tempo cure porque não vou ter novas asas, pois estas não são asas de leite, nem estas irão mudar de cor. Já imaginaste pior situação que a minha? Já imaginaste situação mais triste e animal mais infeliz que eu? Por isso não sejas tolo macaco e não chores por qualquer coisinha, e quando tiveres triste e em situação muito má e esdrúxula pensa em mim e no meu amargo fado.

O macaco, que tudo isto ouviu com muita atenção, começou a chorar com pena da borboleta e da sua má sorte prometendo a esta não voltar a chorar por qualquer acontecimento indigno de tal.

A borboleta partiu. A viagem para lado nenhum era muito custosa e a borboleta fazia-o sempre a caminhar pois se recusava a usar as tresmalhadas asas que deus lhe dera. Depois de umas semanas de viagem encontrou um hipopótamo que rebolava e berrava enquanto uns quantos patos e sapos aflitos se procuravam proteger do hipopótamo rolante e de serem por este esmagados. A borboleta, que a tudo isto assistiu, tentou amainar a situação com agudos berros até que, por fim, o hipopótamo parou de rebolar mas não de chorar. A borboleta aproximou-se e disse:

-Algum de vós, sapos ou patos, me conte o que se passa aqui porque eu sou uma borboleta.

Um pato chegou-se a frente, encheu o peito de ar e disse:

-Quack!

-Algum que fale língua que eu perceba, claro está, pois essa coisa que agora me disseram nada dela eu percebi.

Um sapo, que por ter, de todos os sapos, a pele mais enrugada parecendo por isso ser o mais velho e sábio de todos, chegou-se a frente e disse:

-Quereis que algum de nós presentes vos conte o que aqui se passa? Pois bem, eu estou muito bem qualificado para o fazer porque sou alguém e por isso posso ser eu a fazê-lo. É uma historia um pouco longa por isso lhe pergunto se quer mesmo que eu a conte. Posso continuar? Muito bem, então o que se passa é o seguinte. O meu nome é Arine o Sapo e nasci neste lago que aqui vê e que foi onde cresci e nadei toda a vida, coisa que por acaso sou muito bom, especialmente mariposa. Quereis ver? Eu já lhe mostro.

Dito isto, começou a dar umas tão majestosas braçadas na água, nadando tão rápida e graciosamente que não foi preciso esperar muito para o ver desaparecer no horizonte. Um pequeno pato aproximou-se e disse:

-Não estranheis nem vos preocupeis, acontece sempre isto quando conta uma história, entusiasma-se e só volta no dia seguinte. Eu que aqui estive e que tudo vi posso tomar o seu lugar e contar tudo desta tão triste historia. Este hipopótamo partilha o lago connosco há uns dois anos e é nosso grande amigo. Ontem, enquanto boiava no lago muito descansado e alheio do mundo, um crocodilo surgiu como um relâmpago da agua e comeu-lhe uma das patas e desde então que geme e rebola com dores e saudades da sua pata, colocando todos em risco de ser esmagado, sendo que, por mais traças que imaginemos, não conseguimos, até agora, o tirar deste perigoso desconsolo.

À borboleta, após ouvir tudo isto, vieram as lágrimas aos olhos, mas de tanto rir, e quando finalmente se conseguiu acalmar e recuperar o fôlego disse:

- Tanto barulho e tanto choro por causa de uma pata comida? Se nascesses com seis e agora ficasses com cinco também te desconsolarias? Para nada interessa o número de patas que um animal tem, há muito mais agudas razões para se rebolar e chorar, como o meu caso mas não me vêm a faze-lo, não só porque não quero por em perigo os outros mas porque as tristezas, males e azares só a nós nos dizem respeito e não devemos com isso incomodar os outros.

Os animais ficaram parados e admirados com a borboleta, sem perceber ao certo qual era o problema desta, mas muito tristes e comovidos com o seu azar. A borboleta partiu.

sábado, fevereiro 16, 2008

para vocês, fofinhos!